Menu

REFORMA - Observações sobre as propostas de reforma tributária



Segundo boletim da Receita Federal relativo a 2021, os encargos sobre folha de pagamentos responderam por 25,52% do total da carga tributária e 8,41% do PIB naquele ano, percentual superior à participação do Imposto sobre a Renda (23,92% da carga e 7,88% do PIB), perdendo apenas para a tributação de Bens e Serviços (44,02% e 14,50%, respectivamente).

Discutir reforma tributária ignorando o peso - e o impacto - da folha de pagamentos leva a distorções muito sérias, porque o pressuposto das PECs 110 e 45\19 é o de que, como Serviços é menos tributado, pode-se transferir parte da carga dos Bens para esse setor, para fazer justiça fiscal.

Os ônus sobre o trabalho equivalem a um tributo em cascata que permeia todo o sistema econômico, e apresenta peso maior nas atividades mais utilizadoras de mão de obra, especialmente Serviços.

Assim, onerar mais o setor Serviços com o IBS, sem considerar o peso dos encargos sobre as diversas atividades, pode levar a distorções significativas na distribuição da carga tributária, e inviabilizar muitas atividades intensivas em mão de obra, com reflexos negativos sobre o emprego e a informalidade.

O argumento de que “rico consome serviços e pobre consome produtos” precisa ser devidamente avaliado, porque existe uma ampla parcela da população que pertence à classe média mais baixa e que utiliza serviços públicos devido à insuficiência da oferta.

Além disso, o “cashback”, evolução de uma parcela de imposto, vai criar uma burocracia e pode gerar muita injustiça, pois qualquer valor que for estabelecido deixará de contemplar aqueles que estão ligeiramente acima do limite. Mais importante é o aumento do imposto sobre a cesta básica e outros itens, que irá impactar o IPCA que, com os mecanismos de indexação formal e informal da economia, aumentará a inflação, podendo pressionar também as taxas de juros.

É preciso considerar ainda que dificultar ou inviabilizar as atividades de empresas de serviços repercutirá sobre a oferta de emprego, sendo que em alguns segmentos desse setor os mais atingidos serão os mais pobres, isto é, os menos escolarizados.

A justificativa de que não haverá perdedores porque a economia crescerá significativamente entra em contradição com a necessidade de um período de transição.

A dedução lógica que se pode tirar dessa necessidade é a de que o prometido “crescimento chinês” somente se dará ao fim do período de transição, quando a nova sistemática estará totalmente implantada.

Isso significa que por oito ou dez anos o mais provável é que as mudanças provoquem inflação e recessão, pois aumentam a complexidade burocrática das empresas, com escrituração de dois tributos.

Se a complexidade atual é fator de obstáculo ao crescimento, por dez anos vamos ter a burocracia duplicada.

O setor Serviços sofrerá mudanças profundas na burocracia, sendo obrigado a escriturar o IBS, com todas as dúvidas e complexidade de um imposto novo.

Assim, a principal virtude alardeada da reforma tributária, a da simplificação, entra em contradição com a urgência desejada por todos de um sistema tributário simples, pois levará muitos anos para as mudanças serem implementadas por completo.

A promessa de não aumento da carga tributária esbarra não apenas na falta de dados precisos sobre o impacto das mudanças sobre os preços, mas também na autonomia dos municípios de poderem elevar suas alíquotas.

Além disso, a aprovação da Emenda Constitucional será feita sem que se conheça o teor da Lei Complementar, de sorte que muitas das promessas feitas, de tratamento diferenciado para alguns setores, podem ser frustradas depois.

Uma conclusão que parece clara ao se considerar os tópicos mencionados é a de que será necessário ampliar o debate, e que seria mais lógico, ao invés de partir de modelos pré-concebidos, que se iniciasse o debate sobre as correções que podem ser feitas pela via infraconstitucional, para aprimorar o sistema e depois estudar uma reforma baseada na realidade.

Fonte: Diário do Comércio

 
ver todas as notícias